*Por Thiago Capistrano Andrade
Como forma de ajudar os colegas a refletirem melhor sobre a nossa carreira, trago um pouco do que aprendi sobre impacto orçamentário. Assunto complexo que dificulta a análise de propostas e nos deixa à mercê de palpites, conjecturas e promessas.
As lições do presente artigo foram retiradas do Manual “Impacto Orçamentário-financeiro aplicado à Gestão Pública” da Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal do Governo Federal brasileiro.
De maneira simplificada, é possível calcular o impacto orçamentário seguindo esses passos:
a) Saber qual a mudança (em percentuais ou valores) para proposta de reajuste remuneratório;
b) a partir de qual mês seria a sua implementação;
c) quantos são os servidores afetados pela mudança proposta;
d) Com isso, passa-se a calcular:
Impacto no primeiro ano:
Servidores x Acréscimo R$ da proposta x Número de meses até dezembro do ano de início.
Impacto no segundo ano:
Servidores x Acréscimo R$ da proposta x Doze meses.
Desse total, acrescenta-se o efeito da mudança no terço de férias proporcional (para servidores ativos, apenas) e na gratificação natalina (para ativos e inativos).
Vamos aprofundar essa análise entendendo o conjunto de dados que é preciso coletar para o cálculo detalhado.
Para isso, vamos utilizar como exemplo, os dados necessários para calcular o impacto orçamentário do reajuste remuneratório proposto pelo SINDJUS/DF para o Fórum de Discussão de Carreiras do CNJ, em meados de junho deste ano.
No entanto, cabe advertir que há uma grande dificuldade na obtenção dos dados para fins desses cálculos, considerando a pouca informação disponível pelo CNJ, sendo necessário buscar os dados junto aos tribunais e conselhos do país, em dezenas de portais de transparência.
Portanto, devido a essa dificuldade na coleta dos dados dos órgãos, usaremos os dados disponíveis na apresentação da proposta emergencial realizada pelo especialista Luiz Alberto dos Santos, acerca da proposta do SINDJUS/DF já citada, cujo arquivo circulou nas redes à época.
Link: https://drive.google.com/file/d/1BUsq-cXmzFLa_5ZBm4tD51poXNB0Ccpk/view?usp=drive_link
Universo da Análise
Trata-se do quadro funcional do órgão público objeto da análise. Se, por exemplo, vamos trabalhar o impacto do Poder Judiciário da União, o universo da análise são todos os servidores das entidades que compõe o Judiciário federal, ativos e inativos (aposentados e instituidores de pensão com direito à paridade e integralidade).
Conjunto da Análise
Trata-se da delimitação do quadro funcional. Ou seja, um conjunto destacado do Universo a ser pesquisado.
É importante sabermos como se distribuem os servidores ao longo das carreiras. No caso do PJU, as carrerias possuem três classes e treze padrões, sendo do A-1 ao C-13.
Para fins didáticos, tomaremos, como exemplo de Conjunto da Análise, os Técnicos Judiciários ativos, na classe C, Padrão 13.
Assim, o Conjunto de Análise que escolhemos tem 64,9% de um total de 55.365 servidores, correspondendo ao número de 35.932 servidores Técnicos Judiciário em atividade, na Classe C, padrão 13 da carreira.
Elemento de Cálculo
Refere-se aos elementos remuneratórios que sofrerão reajustes. No caso do PJU, temos Vencimento Básico, Gratificação de Atividade Judicial (GAJ), Adicional de Qualificação, Auxílio Alimentação, etc.
A proposta do SINDJUS/DF foi de aumento da GAJ, de 140% para 190%, de forma parcelada.
Fator de Cálculo (Fc)
Valor em percentuais ou em reais que será aplicado sobre o elemento de cálculo. É o reajuste propriamente dito, que pode ser a criação de uma espécie remuneratória nova ou a mudança de uma existente.
No PJU, a GAJ é calculada sobre o Vencimento Básico. A proposta de nosso exemplo sugeriu aumento da GAJ para 190%, mas de forma parcelada, sendo, no primeiro ano, 155% em maio e 165% em novembro.
Para fins didáticos, vamos limitar também o cálculo do impacto da proposta apenas no primeiro ano de aumento, de 140% da GAJ para 165%.
Como a GAJ é calculada sobre o Vencimento Básico. Portanto, temos no C-13 de Técnico os seguintes valores a serem trabalhados.
1º Aumento (Maio/2025) = (GAJ 155%) – (GA 140%)
1º Aumento (Maio/2025) = R$ 849,52
2º Aumento (Novembro/2025) = (GAJ 165%) – (GAJ 140%)
2º Aumento (Novembro/2025) = R$ 1.415,87
Data de referência base
Período utilizado para identificar o início do dos cálculos com os acréscimos e decréscimos a serem projetados. Por exemplo, a data de referência base do último reajuste no PJU foi em 20 de Janeiro de 2023, contando a primeira remuneração para Fevereiro.
Para nosso exemplo, temos Maio de 2025 como data de referência inicial.
Cenário Base
Seria a posição inicial encontrada da despesa com pessoal que, para o cálculo de impacto orçamentário, pode ser obtida de duas formas:
a) pode-se considerar o custo da folha de pagamento contabilizado (por exemplo, custo da despesa com pessoal no orçamento executado em 2023 e previsão orçamentária de custo de pessoal para 2024);
b) ou se pode calcular a partir de uma situação zerada, ou seja, do cálculo apenas dos acréscimos e decréscimos a serem sugeridos às rubricas remuneratórias.
No nosso exemplo, como temos limitações de dados disponíveis sobre o PJU, é mais fácil utilizarmos a base zero, considerando apenas o que precisamos acrescentar na proposta, que será o primeiro ano do reajuste da GAJ.
Observação: a título de curiosidade, não se trata de nosso exemplo, mas é importante saber que o decréscimo de uma espécie remuneratória só é possível de ser sugerida se observado o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos, portanto, para um decréscimo de uma espécia remuneratória é necessário um acréscimo do mesmo valor ou maior em outra espécie remuneratória com compõem os vencimentos.
Cenário de Projeção
Compreendendo o conceito de Cenário base, fica fácil de entender que o Cenário projetado seria o do Cenário com as mudanças remuneratórias propostas. Assim, normalmente se faz a projeção do impacto orçamentário do ano da implantação da proposta de lei e do ano ou dos anos seguintes.
No primeiro ano, o impacto tende a ser menor em razão da data de referência para a implantação da nova regra, que não contemplaria todos os meses do ano, à exceção de uma implantação já no mês de janeiro.
No nosso exemplo, há dois momentos, uma parcela seria em Maio e a outra em Novembro de 2025.
Impacto Orçamentário-financeiro
Trata-se do cálculo do Impacto de toda proposta com despesa de pessoal e pode ser resumida em:
Impacto = Cenário de Projeção – Cenário Base
ou
Impacto = Acréscimos financeiros do custo total da despesa proposta
Portanto, temos os seguintes dados para o cálculo de estimativa de impacto:
a) Universo da Análise: Servidores do PJU
b) Conjunto da Análise (Técnicos Judiciários Ativos C-13): 35932
c) Elemento de cálculo (GAJ 140%): R$ 7.928,86
d) Fator de Cálculo (165%, primeiro ano): primeira parcela de acréscimo de R$ 849,52 e segunda parcela de R$ 1.415,87;
e) Data de referência base: primeira parcela em Maio e segunda parcela em novembro de 2025.
f) Cenário base: base zero (calcula apenas o acréscimo a ser realizado na despesa de pessoal);
g) Cenário projetado: faremos apenas o primeiro ano da proposta de aumento;
1º cálculo: Impacto Orçamentário mensal
Para sabermos o impacto da proposta em um único mês, precisamos calcular o número de servidores afetados pela mudança multiplicado pelo valor do acréscimo remuneratório.
No entanto, faz-se oportuno observar que é preciso considerar o 13º salário, equivalente a outro mês de vencimentos, e o terço de férias, correspondente a terça parte de um mês de vencimentos, e que, para efeitos de um mês do ano apenas, são valores obtidos pela divisão por doze meses.
Portanto, para a conta do 13ª salário proporcional, deve-se multiplicar por 13 o resultado do valor de acréscimo na remuneração multiplicado pelo número de servidores do conjunto analisado, e depois divide tudo por doze. Vejamos:
Impacto orçamentário de um mês da primeira parcela da proposta, considerando o décimo terceiro salário proporcional = [(GAJ 155% – GAJ 140%) * Servidores Técnicos C-13 * 13] / 12.
E o terço de férias proporcional a um mês, multiplica o primeiro resultado (proposta * servidores) por 0,33 e depois divide por doze meses.
Logo, para simplificar, podemos multiplicar tudo por 13,33 e depois dividir por doze, que encontraremos o valor do impacto orçamentário da proposta proporcional a um mês. Já para cálculo com servidores inativos (aposentados e instituidores de pensão), que não possuem férias, só se multiplicaria por 13.
Vejamos como fica:
Então, temos Impacto Mensal da primeira parcela da proposta de reajuste =
[(GAJ 155% – GAJ 140%) * Servidores Técnicos C-13 * 13,33] / 12 =
[R$ 849,52 * 35.932 * 13,33] / 12 =
[R$ 406.897.618,69] / 12 =
- Impacto Mensal da primeira parcela da proposta = R$ 33.908.134,89
Agora avançamos no Impacto Mensal da segunda parcela =
[(GAJ 165% – GAJ 140%) * Servidores Técnicos C-13 * 13,33] / 12 =
[R$ 1.415,87 * 35.932 * 13,33] / 12 =
[R$ 678.164.294,39] / 12 =
- Impacto Mensal da segunda parcela da proposta = R$ 56.513.691,20
2º cálculo: Impacto Orçamentário do primeiro ano da proposta
Encontrando os impactos mensais de cada parcela proposta, podemos agora encontrar o impacto total do primeiro ano da proposta, da seguinte maneira:
De maio a novembro, temos 6 meses de aplicação da primeira parcela da proposta; e de Novembro a Dezembro, temos apenas 2 meses para terminar o ano.
Impacto Orçamentário do primeiro ano =
(Impacto Mensal primeira parcela * 6 meses) + (Impacto Mensal segunda parcela * 2 meses) =
(R$ 33.908.134,89 * 6) + (R$ 56.513.691,20 * 2) =
R$ 203.448.809,34 + R$ 113.027.382,40 =
Impacto Orçamentário da proposta é de R$ 316.476.191,74 (trezentos e dezesseis milhões, quatrocentos e setenta e seis mil, cento e noventa e um reais e setenta e quatro centavos) para proposta de reajuste para Técnico Judiciários da Classe C, Padrão 13, em atividade.
CONCLUSÃO
Sendo compreendida a fórmula, basta o calculista realizar a análise de cada cargo, a partir de cada classe e padrão da carreira, incluindo aposentados e instituidores de pensão.
Nesse caso, em que o acréscimo foi sugerido na GAJ, não há repercussão em outras espécies remuneratórias. Porém, se uma proposta incidir sobre, por exemplo, o Vencimento Básico, isso implicará efeitos em tudo que for correlacionado, tais como a própria GAJ, Adicionais de Qualificação e também em gratificações exclusivas de Oficiais de Justiça e Policiais Judiciais (GAE e GAS).
Como as informações são difíceis no PJU e MPU, possivelmente os cálculos devem buscar uma estimativa, usando parâmetros diversos. Quanto mais detalhada as informações, certamente, mais aproximado o resultado.
Espero ter ajudado aos colegas interessados na construção e discussão de propostas, para um melhor entendimento do assunto.
Observação: se quiserem dar alguma sugestão ou contribuir com mais informações, podem entrar em contado comigo no Whatsapp (84) 99161-9419 para que possamos melhorar o presente texto.
* Thiago Capistrano Andrade é Técnico Judiciário, lotado na Justiça Eleitoral do Rio Grande do Norte
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