A política de reajustes percentuais idênticos para todos, aplicada há quase três décadas, gerou uma valorização desigual entre Analistas e Técnicos, com o ganho real do primeiro sendo R$ 3.840,02 maior. Estudo detalhado da ANATECJUS expõe como a diferença salarial, que era de R$ 1.015,03 em 1996, hoje ultrapassa R$ 8.700.
Dando seguimento à análise sobre as carreiras do Poder Judiciário da União (PJU), que na primeira parte revelou uma profunda (con)fusão de atribuições entre Técnicos e Analistas, este segundo capítulo do dossiê mergulha nos números para desvendar a origem da crescente disparidade salarial entre os cargos.
Relembre a Parte ⅓ do Dossiê do PJU: https://anatecjus.org.br/dossie-pju-parte-1-3-dados-oficiais-revelam-a-confusao-de-atribuicoes-entre-tecnicos-e-analistas-no-judiciario-federal/
O estudo realizado pela ANATECJUS faz análise minuciosa da política remuneratória adotada desde 1996 e aponta que a aplicação sistemática de reajustes lineares — um aumento remuneratório concedido com base em índices percentuais iguais aplicados ao Vencimento Básico (VB) e/ou à Gratificação de Atividade Judiciária (GAJ) — é a principal causa do abismo que hoje separa as duas carreiras.
A pesquisa foi baseada em dados públicos e na cronologia das leis que reajustam VB e GAJ dos cargos e demonstra que, embora ambas as carreiras tenham tido ganhos reais significativos (acima da inflação), a valorização não foi equitativa. A cada nova lei de reajuste, a diferença absoluta em reais entre os salários de Analistas e Técnicos aumentou exponencialmente, gerando uma distorção que desvaloriza o cargo de Técnico Judiciário.
O Que os Especialistas Dizem
Na iminência de uma reestruturação de carreiras no PJU, a análise do especialista Itamar Nascimento[i] é bastante pertinente. Em seu Manual de Planos de Carreiras, ele explica que há uma vida útil de todo plano de carreira, pois uma hora as suas regras sofrerão alterações, desfigurando o modelo original, “mormente em razão das transformações que naturalmente ocorrem na sociedade, na política, na economia e na tecnologia, de modo geral”.
Para Nascimento, sob a perspectiva da Administração, faz-se necessário refletir sobre quais são as tendências esperadas para o órgão, os cargos e instituição que poderão impactar no modelo de PCCS vigente. Sob a perspectiva do servidor em atividade, a vida útil da carreira coincidirá com a chegada ao seu último nível na carreira. Nessa fase, a permanência do engajamento e da produtividade depende do que ele chama de “fatores de retenção”. E, na ausência de mecanismos que valorizem o servidor estagnado, os efeitos de uma política remuneratória falha, que depende apenas de reajustes, tornam-se inevitáveis e evidentes, gerando frustração e desestímulo.
A política de reajuste linear mascara as distorções salariais e perpetua desigualdades, negando aos servidores o reconhecimento por sua qualificação e contribuição para o serviço, pois se oferece em termos percentuais iguais, assumindo ares de igualdade, que na prática não existe.
Regina Pacheco, professora da Fundação Getúlio Vargas e pesquisadora da área de Governo e Gestão Pública, estudiosa das disfuncionalidades da burocracia no Brasil, afirma que, historicamente, a política de remuneração no setor público sempre foi a de aplicar aumentos salariais lineares, sob o mesmo índice percentual. Na década de noventa esse problema se agravou, vindo a tornar-se uma preocupação do no Governo FHC, que manteve uma política de arrocho salarial, tendo adotado medidas de reajustes diferenciados para carreiras específicas do alto escalão, para correção das disparidades com o setor privado. Contudo, apenas entre 2003 e 2006, o sistema de aumentos lineares foi alterado para aumentos nominais diferenciados para cargos que tinham recebido os menores reajustes nos últimos anos. É como consta da análise realizada pela pesquisadora[ii]:
Historicamente a política de remuneração sempre foi a de praticar aumentos salariais lineares, concedendo o mesmo índice de reajuste para todos os servidores. (…)
Entre 2003 e 2006, o governo Lula alterou a política salarial. (…) passou a conceder aumentos maiores aos servidores que tinham recebido menores reajustes nos anos anteriores, independente da função exercida. Foram definidas como “principais bases dos reajustes 2003/04”, entre outras:
(…) interromper a política adotada pelo governo anterior, que aprofundaria cada vez mais o fosso entre os maiores e os menores salários do funcionalismo federal; beneficiar setores do funcionalismo federal que tiveram menor reajuste nos últimos anos.
Os aumentos concedidos aos integrantes do Plano de Classificação de Cargos (PCC) demonstram a política adotada:
No período de dezembro de 2002 até fevereiro de 2007, quando se completa a proposta apresentada pelo governo, o servidor ativo do PCC, de nível superior, em final de carreira, terá um reajuste na rua remuneração de 67,4%; o nível intermediário, 89,3% e o nível auxiliar 137,8%. É um reajuste expressivo se considerar que a inflação do período deverá ficar em cerca de 30%.
Para a professora, o fracasso em estabelecer uma burocracia meritocrática no país tem raízes histórico-sociológicas, e a política de reajustes lineares é sua expressão mais clara, pois sacrifica o mérito em nome de uma falsa isonomia. E, após um breve período de correções no passado, a situação das assimetrias salariais voltou a se agravar.
Buscando romper com essa lógica no âmbito do Poder Executivo, o Governo Federal publicou a Portaria MGI nº 5.127, de 13 de agosto de 2024[iii]. O documento estabelece um roteiro para futuras reestruturações, com diretrizes que atacam a raiz do problema também visto no PJU, tais como:
- Agrupamento de carreiras com atribuições similares;
- Uniformização da remuneração para cargos de complexidade e responsabilidade equivalentes.
A iniciativa do Executivo demonstra que o reconhecimento da equivalência de atribuições e responsabilidades é o critério técnico e justo para a definição de uma política salarial. É o caminho que o Poder Judiciário precisa urgentemente começar a trilhar.
Contudo, há persistência de reajustes lineares, mesmo no Executivo, que revelam a profundidade do problema. É o caso recente da crítica de especialistas[iv] sobre o reajuste linear de 9% para todos os servidores que ainda enfrentam distorções na remuneração, gerando desigualdades entre carreiras.
Segundo Bruno Carazza, professor da Fundação Cabral, “Dar um novo reajuste sem pensar em mudar incentivos ou estabelecer uma política séria de avaliação de desempenho é empurrar o problema para frente.” E para o Gerente de inteligência do Centro de Liderança Política, Daniel Duque, “O reajuste linear acaba mantendo desigualdades entre carreiras”.
Sabe-se que, devido à ausência no serviço público de critérios técnicos profissionais para criação, concessão de reajustes ou correção salarial[v], essa lacuna da gestão de pessoas cede lugar ao poder de barganha político. No caso do PJU, vê-se a força da cultura de uma política de reajustes lineares no meio sindical e na Administração, conforme o histórico dos aumentos remuneratórios.
O Efeito Multiplicador da Desigualdade
A raiz do problema reside na própria matemática do reajuste linear. Ao aplicar um mesmo percentual sobre bases salariais diferentes, o aumento nominal é sempre maior para quem já tem a remuneração mais alta. É como, por exemplo, aplicar 10% sobre R$ 1.500,00 e sobre R$ 1.000,00.
Além disso, toda vez que se aplica um novo reajuste, não se faz para correção do valor da remuneração originária, mas sempre sobre o montante decorrente do último reajuste concedido. Cuida-se de um aumento exponencial que potencializa o efeito da desigualdade ao longo dos anos e após reajustes seguidos. Imagine os mesmos valores do primeiro exemplo, já corrigidos (R$ 1.650,00 e R$ 1.100,00), recebendo novamente mais 10% de correção, para observar-se o esse feito cumulativo.
Essa prática, repetida ao longo de 27 anos no PJU, produziu um efeito devastador na equidade da estrutura remuneratória. CLIQUE AQUI para entender, com mais detalhes, a cronologia das normas que regulamentaram as carreiras do PJU.
A tabela abaixo, compilada a partir das leis que reajustaram os vencimentos das carreiras, evidencia o crescimento da diferença salarial no final de carreira de cada cargo:

*Todas as leis, desde 1996, concederam reajuste no VB e/ou GAJ com efeito de índice linear.
**Excepcionalmente em 2006, o aumento em percentual total para técnico foi de 64,77%.
Como os dados mostram, a diferença salarial saltou de R$ 1.015,03 em 1996 para R$ 8.708,81 em 2023, um aumento de mais de 700% na desigualdade entre os cargos. Ao mesmo tempo, demonstra que o Técnico atualmente tem remuneração no mesmo patamar da remuneração do Analista em 2012, portanto, há mais de uma década.
A Prova do Prejuízo: Disparidade no Ganho Real
Para entender o tamanho da distorção, é preciso calcular o “Ganho Real” de cada carreira, ou seja, quanto a remuneração aumentou para além da simples correção da inflação. Ou seja, quanto cada carreira foi mais valorizada que a outra.
Entre dezembro de 1996 (início da vigência da Lei nº 9.421) e janeiro de 2023 (início da vigência da Lei 14.523), a inflação acumulada (IPCA), segundo dados do IBGE, foi de 379,67%.
Aplicando essa correção às remunerações de final de carreiras vigentes em 1996, a análise chega a uma conclusão contundente:
- Remuneração de Técnico em 1996 corrigida pela inflação: R$ 7.264,79
- Remuneração de Analista em 1996 corrigida pela inflação: R$ 12.133,58
- Remuneração de Técnico atualmente: R$ 13.592,33
- Remuneração de Analista atualmente: R$ 22.301,14
O Ganho Real ocorre se a remuneração atual for maior que a remuneração corrigida pela inflação. Calculando Remuneração atual menos remuneração corrigida para os cargos, temos:
- Ganho Real do Analista (valorização da carreira): R$ 10.167,56
- Ganho Real do Técnico (valorização da carreira): R$ 6.327,54
- Diferença de valorização entre os cargos: R$ 3.840,02
A diferença entre esses valores revela o cerne da injustiça:
- O cargo de Analista Judiciário foi valorizado em R$ 3.840,02 a mais que o cargo de Técnico Judiciário. Um acréscimo de 60,68% no poder de compra de um em relação ao outro.
Se a política remuneratória tivesse como objetivo manter o poder de compra e a valorização equitativa estabelecida em 1996:
- A diferença salarial hoje deveria ser de apenas R$ 4.868,79 (a diferença original corrigida pela inflação);
- O valor que excede isso (R$ 3.840,02) representa a distorção acumulada.

Vamos simplificar a ideia de “poder de compra/consumo”. Digamos que em 1996, tanto o Analista quanto o Técnico conseguiam pagar suas contas e viver bem com seus salários. Se a remuneração de ambos fosse apenas corrigida pela inflação, essa situação se manteria igual hoje.
Contudo, os reajustes lineares (com o mesmo percentual para todos) criaram um ganho real, ou seja, um “dinheiro extra” no poder de compra de cada um. O problema é o tamanho desse “extra”:
- Com seu ganho real, o Analista ganhou um poder de compra adicional de R$ 10.167,56. Ele pode usar esse valor para comprar, todos os meses, um notebook de R$ 8.000 e ainda lhe sobram mais de R$ 2.000 para outras coisas.
- Já o Técnico ganhou um poder de compra adicional de R$ 6.327,54. Ele não consegue comprar o mesmo notebook com seu ganho extra.
A aplicação de percentuais iguais em salários diferentes fez com que o poder de consumo adicional do Analista se tornasse R$ 3.840,02 maior que o do Técnico. Na prática, a cada reajuste, o Analista não só se distanciou, como recebeu um “bônus” que consolida uma enorme e crescente desigualdade.
Uma Correção Necessária
É crucial entender a incoerência desse processo: a política remuneratória caminhou para um lado, enquanto a realidade das atribuições caminhou para o outro. Se houvesse uma separação clara de tarefas — como existe entre um engenheiro e um advogado —, a diferença seria justificada. O que se vê, no entanto, não é uma relação de hierarquia funcional, mas de sobreposição de complexidade, responsabilidade e desempenho, tornando a disparidade salarial não apenas injusta, mas administrativamente ilógica.
Para corrigir a distorção histórica causada pelos reajustes lineares, seria necessário um acréscimo de R$ 3.840,02 à remuneração final do Técnico Judiciário. Isso elevaria o salário de R$ 13.592,33 para R$ 17.432,02, um valor que simplesmente restabelece a paridade de ganhos reais entre os cargos, conforme a proporção original de 1996.
O gráfico a seguir ilustra visualmente o crescimento dessa disparidade e projeta qual seria a remuneração correta do Técnico se a equidade inicial tivesse sido respeitada.

A linha verde no gráfico representa a remuneração do Técnico corrigido com equidade e proporcionalidade, mostrando uma trajetória muito mais próxima da remuneração do Analista (linha vermelha), em contraste com a linha azul (salário atual do Técnico), que se distancia progressivamente.
A análise conclui que a escolha por reajustes lineares, sem nunca ter realizado alguma medida corretiva, longe de ser um detalhe técnico, foi uma decisão política que, na ausência de critérios profissionais de gestão de pessoas, baseado em mérito, desempenho ou mesmo primando a equidade, consolidou e aprofundou uma desigualdade que clama por correção.
Cabe também observar que, por outras razões, a situação chegou a um ponto crítico: hoje, um Técnico em final de carreira (padrão C-13: R$ 13.592,35) ganha menos que um Analista em início de carreira (padrão A-1: R$ 14.852,66), tendo sido aumentada essa diferença também em razão dos reajustes lineares.
Portanto, a desvalorização não apenas ignora a experiência e o conhecimento acumulados ao longo de décadas, mas agrava a injustiça já apontada na primeira parte deste dossiê: a de que ambos os cargos executam as mesmas tarefas.
Assim, enquanto as atribuições de Técnicos e Analistas se tornavam funcionalmente convergentes, suas remunerações seguiram uma trajetória matematicamente divergente, gerando uma distorção que desafia a lógica administrativa e o princípio da isonomia material.
Da Equidade nos Próximos Reajustes: Uma Proposta de Correção Constitucional
A política remuneratória do serviço público se encontra em um aparente dilema constitucional. De um lado, o art. 37, X, da Constituição Federal, ao prever a Revisão Geral Anual (RGA), determina a aplicação de índices iguais, sugerindo uma isonomia formal. De outro, o art. 39, § 1º, exige que a remuneração reflita a complexidade e a responsabilidade dos cargos, e o art. 5º consagra o princípio da isonomia em sua dimensão mais ampla e material.
A única forma de harmonizar esses mandamentos é reconhecer que a aplicação de um reajuste para recompor perdas inflacionárias não pode servir como um instrumento para aprofundar desigualdades. Portanto, em um cenário de disparidade comprovada como o do PJU, qualquer reajuste futuro, para ser constitucional, deve ser composto por dois elementos: um índice geral, que cumpre o requisito formal do art. 37, X, e um fator de correção, que atende ao imperativo de equidade do art. 39, § 1º.
A lógica é simples: o cargo de menor remuneração (Técnico Judiciário) não pode ter sua desvalorização histórica agravada a cada nova lei. Assim, o reajuste do Técnico deve ser calculado de modo a garantir que sua valorização em termos reais seja proporcional à do Analista, neutralizando o efeito distorcivo do reajuste linear.
Simulação Prática: Aplicando o Fator de Correção em um Reajuste de 8%
Para ilustrar como este modelo funcionaria na prática, simulamos a aplicação de um reajuste geral hipotético de 8% sobre as remunerações atuais.
a) Cálculo do Ganho do Analista (Parâmetro de Valorização):
- Remuneração Atual do Analista: R$ 22.301,14
- Reajuste Linear de 8%: R$ 22.301,14 x 8% = R$ 1.784,09 (aumento nominal)
b) Cálculo do Ganho do Técnico (Modelo Atual, com Distorção):
- Remuneração Atual do Técnico: R$ 13.592,33
- Reajuste Linear de 8%: R$ 13.592,33 x 8% = R$ 1.087,38 (aumento nominal)
Análise: Neste cenário, o Analista receberia um aumento R$ 696,71 maior que o do Técnico, aprofundando o abismo salarial.
c) Cálculo do Reajuste Equitativo (Modelo Corrigido):
Para garantir a paridade de ganhos reais, o reajuste do Técnico deve ser calculado sobre a remuneração que ele deveria ter se a proporção de 1996 tivesse sido mantida.
- Remuneração do Técnico Corrigida (base de cálculo justa): R$ 17.432,35
- Reajuste Equitativo: R$ 17.432,35 x 8% = R$ 1.394,58 (aumento nominal justo)
d) Determinação do Fator de Correção:
O fator de correção é a diferença entre o reajuste justo e o reajuste distorcido, que precisa ser adicionada ao índice geral.
- Diferença Necessária: R$ 1.394,58 – R$ 1.087,38 = R$ 307,20
- Cálculo do Fator Percentual: (R$ 307,20 / R$ 13.592,33) x 100 = 2,26%
Portanto, para um reajuste geral de 8%, a única forma de respeitar a isonomia formal e material seria aplicar o índice geral de 8% para ambos os cargos, acrescido de um fator de correção de 2,26% exclusivamente sobre a remuneração do Técnico Judiciário. Este modelo não apenas impede o avanço da desigualdade, como inicia um processo gradual e matematicamente defensável de correção da distorção histórica, em total conformidade com os princípios constitucionais da isonomia, razoabilidade e eficiência administrativa.
Conclusão: Para Além da Isonomia Formal, um Imperativo de Coerência e Justiça
A análise detalhada da estrutura remuneratória do Poder Judiciário da União, exposta neste dossiê, revela uma verdade incontornável: a política de reajustes lineares, praticada por quase três décadas, embora amparada por uma interpretação literal do art. 37, X, da Constituição, tornou-se um mecanismo ativo de desvalorização e de aprofundamento da desigualdade. Sob a aparência de uma isonomia formal, que trata todos com o mesmo índice, esconde-se uma profunda iniquidade material que viola o espírito do art. 39, § 1º, ao ignorar a convergência de complexidade e responsabilidade entre os cargos de Técnico e Analista Judiciário.
A matemática da disparidade é inequívoca: o cargo de Analista foi sistematicamente mais valorizado, recebendo um ganho real R$ 3.840,02 superior ao do Técnico, um fato que não pode ser justificado por critérios técnicos ou meritocráticos, mas apenas pela inércia de um modelo que beneficia o topo em detrimento da base. Essa distorção, como demonstrado, não é um problema abstrato; ela gera consequências concretas que minam a eficiência da máquina pública, como a desmotivação, o “fatalismo salarial” e o incentivo à “fuga de cérebros” interna.
A incoerência de se propor mais um reajuste linear em 2026, ao mesmo tempo em que se promete discutir a redução da disparidade no futuro, evidencia um ciclo de decisões paliativas que apenas postergam a solução e agravam o problema, especialmente diante das crescentes restrições fiscais do Estado brasileiro. O caminho para a equidade não está em medidas pontuais ou na criação de novas “castas” por meio de gratificações setorizadas, mas sim em uma reestruturação corajosa e tecnicamente fundamentada.
Portanto, a correção da estrutura remuneratória do PJU transcende a pauta sindicalista para se tornar um imperativo de boa governança e de respeito aos princípios constitucionais. A adoção de um modelo que, além de um índice geral, incorpore um fator de correção para o cargo historicamente prejudicado, é a única via para alinhar a política salarial à realidade funcional, restaurar a isonomia material e começar a construir um serviço público onde o valor do trabalho seja, de fato, o critério para uma remuneração justa.
Na próxima matéria, a parte 3/3 do Dossiê PJU, aprofundaremos o aspecto jurídico e os cases de outros órgãos públicos.
Técnicos, venham se somar à ANATECJUS e ajudem a fortalecer a defesa de nossa carreira. Filiem-se!
Referências:
[1] NASCIMENTO, Itamar André Rodrigues do. Manual de Planos de Carreiras à Luz do Princípio da Eficiência na Administração Pública. Curitiba: CRV, 2003. 256p.
[1] PACHECO, Regina Silvia. Profissionalização, mérito e proteção da burocracia no Brasil. In: Burocracia e política no Brasil: Desafios para a ordem democrática no século XXI. Orgs. Maria Rita Loureiro, Fernando Luiz Abrucio, Regina Silvia Pacheco. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010. 392p.
[1] BRASIL. Portaria MGI nº 5.127, de 13 de agosto de 2024. Estabelece Diretrizes e critérios (…) na elaboração de propostas de criação, racionalização e reestruturação de planos, carreiras e cargos, bem como ampliação do quantitativo de cargos efetivos. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-mgi-n-5.127-de-13-de-agosto-de-2024-578207466
[1] GALDEANO, Luany. Reajuste para servidor repõe perda salarial de 23%, mas mantém desigualdades. Folha de São Paulo, [S.l.], Online, 2025. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ mercado/2025/05/reajuste-para- servidor-repoe-perda-salarial-de-23-mas-mantem-desigualdades.shtml
[1] CAMPAGNAC, Vanessa et al. Anuário de gestão de pessoas no serviço público 2024 [livro eletrônico]. Rio de Janeiro: República.org, 2024. (Anuário de gestão de pessoas no serviço público). Disponível em: https://dados.republica.org/biblioteca
Outras referências:
https://www.gov.br/planalto/pt-br